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Sábado, 19 de Janeiro de 2013

O meu testemunho, passado estes 7 anos...

Como tudo começou…

Como eu comecei a viver a minha vida com o antes e o depois do cancro…é assim que hoje divido a vida…

Sim, porque muita coisa muda, muda…porque o tempo passa…e até possivelmente mudaria se não fosse o cancro, mas ele teve cá….e dificilmente haverá um dia da minha vida que eu não me lembre…

Falando primeiro de mim, no antes…

Vivia sozinha, tinha 35 anos, solteira, e tinha 2 trabalhos, ou seja levava o dia a trabalhar ate as 23h15m. Mas gostava do que fazia.

Tinha uma pessoa, que me preenchia o coração, um relacionamento leve e descontraído, mas bem vivido, como sempre quis, ou seja, tinha uma pessoa em quem podia confiar e amar…sem pensar em mais nada…

E resumindo era uma pessoa feliz, cheia de vida…só que houve um mas…e esse mas, chamou-se cancro da mama.

Primeiro começou com uma cotovelada num encontro de amigos, doeu-me e nunca mais deixei de ter uma sensação estranha na mana, e por incrível que pareça a mesma pessoa passado 8 dias, já em outro local, voltou a dar-me uma cotovelada na mesma mama, no mesmo sítio. O que me doeu ainda mais. E a impressão não desaparecia.

Fui ao centro de saúde, mandaram-me fazer eco, eco essa que não acusou nada, mas já eu sentia um empastamento na mama, que não me agradava e não fiquei confiante daquele resultado, porque mesmo não sendo algo preocupante teria que aparecer no relatório da eco referência a esse empastamento.

Depois verifiquei que no soutien na direção do mamilo, havia uma pinga de sangue, minúscula, mas estava lá, e isso ainda me deixou mais alarmada. Voltei ao Centro de Saúde, disseram-me para voltar a fazer eco, mas para não fazer com o mesmo radiologista e assim foi.

A médica, disse-me que via ali microcalcificações (que para mim era chinês) e que tinha que fazer mamografia, para eu ir ter com ela ao hospital dai a 8 dias.

Fui para casa e obviamente, fiz o que toda a gente faz, fui para a net ver o que era microcalcificações e obviamente não gostei do que li. Mais assustada fiquei.

Dai a 8 dias, estava no hospital sozinha para fazer a mamografia, de mamografia, rapidamente a médica me questionou se queria fazer biopsia naquele dia ou dali a 8 dias, porque seria preciso, que eu era muito nova e não podíamos deixar duvidas para trás, fiquei em pânico, comecei a chorar, estava a ver a minha vida a andar para trás…já tinha vivido aquilo tudo com a minha querida tia e o desfecho dela foi o pior. Faleceu numa cama de hospital no IPO, numa madrugada de domingo, sozinha e eu não queria isso para mim, mas era só o que conseguia pensar… cancro da mama…não…

Fiz a biopsia logo, não aguentaria esperar mais 8 dias, estávamos em Janeiro de 2006 e as minhas dúvidas tinham começado em Novembro, era muito tempo…para quem queria ouvir que estava tudo bem.

Dali á consulta de decisão, foram mais 8 dias, 8 dias angustiantes, sem querer pensar no assunto, mas sem conseguir, não alarmei ninguém, e muito menos transmiti o que estava a sentir, tinha para mim que a minha sentença estava marcada, e que o resultado ia ser mesmo cancro da mama, e não me enganei.

Quando no meio da consulta com um número de médicos elevadíssimo a olhar para mim, me disseram a Isabel tem cancro da mama….O mundo caiu-me em cima, comecei a chorar, não queria estar ali, não queria ouvir isso, e gritei que não queria ter um cancro, queria ter um filho….tinha 35 anos…senti-me perdida…abandonada…e muita tristeza. O destino estava traçado, quimioterapia para diminuir os 3 cm de cancro, mastectomia e radioterapia…tinha direito a tudo…como tudo muda em minutos…

Como morava sozinha, mudei-me para a casa dos meus pais, de onde tinha saído em 2003. Não tinha coragem de passar as noites sozinhas, muitas delas ao início eram em branco.

No dia seguinte estava a fazer quimioterapia de cabeça erguida, a querer lutar e a dar um ano à doença…estávamos 20 de Janeiro de 2006.

A quimioterapia foi terrível, dores musculares, febres, ma disposição, aftas, falta de apetite, diarreias, mau sabor na boca, pernas inchadas, intolerância a certos cheiros, ao calor, mau humor.

O cabelo caiu logo depois da primeira quimio, usei prótese capilar, não me gostei de ver com os lenços. E tinha dias que não suportava a peruca, estava desejosa de chegar a casa para a tirar. Não deixei de trabalhar, só nos dias em que estava menos bem, é que ficava em casa.

Fiz 8 quimios, Graças a Deus sempre dentro das datas previstas, chorei muito, muitas vezes nem sabia porque estava a chorar, tinha a técnica de ir para o espelho e perguntar a isabel refletida no espelho, o que se passava hoje que não fosse igual a ontem que não tinha chorado. E era uma terapia para mim. A Isabel do espelho respondia que nada e a Isabel acabava por perceber que afinal, não tinha motivos para chorar, porque as coisas estavam a correr bem.

Tive muito apoio da família, de amigos chegados e do meu grande amor, que nunca me falhou, as coisas ficaram mais serias e acabamos por assumir o nosso relacionamento e foi tão importante, esse passo. Aliás um dos meus pensamentos, quando soube que tinha cancro, foi dizer ao Jorge para viver a vida dele, porque eu tinha uma batalha grande pela frente, mas não fui capaz de o fazer.

Também tive desilusões, amigos que não perguntaram como estás Isabel tantas vezes como eu esperava, uns que nem se chegaram ao pé, outros que eu achava que podia contar e não contei, valeu amizades novas de onde as vezes menos se esperam.

Depois veio a Cirurgia, o tumor tinha reduzido o suficiente para não tirar a mama, e o médico perguntou-me se eu queria tirar ou não, ao que respondi prontamente que me tinha preparado 6 meses para a mastectomia, logo era para tirar.

O mês de agosto que era para mim um mês de praia, ferias, sol e diversão, fui ser operada. Dia 10, já mais esquecerei. Correu bem. E vi logo a cicatriz no dia seguinte. O penso não estava bem colado e acabei por ver e não tive vergonha de o Jorge ver, era a Isabel que tinha restado depois do cancro da mama e tínhamos que saber os dois lidar com isso. E não foi difícil. Claro que depois com o tempo, parava para pensar e vinha-me uma lagrima ao canto do olho, o que me havia de ter acontecido, mas eram momentos de fraqueza que passavam rápido. Ainda não disse, mas o que eu mais gostava no meu corpo, era as minhas maminhas…

A recuperação passou e fui chamada para a radioterapia, já eu andava a por mama e tirar mama, pois comecei a usar um paninho a fazer de mama, porque ao início ainda não podemos usar a prótese e mesmo durante a radio, foi o que usei.

Quanto a prótese capilar, deixei-a no dia que sai do hospital quando fiz a mastectomia, já iam ser próteses a mais e até porque o cabelo já tinha começado a crescer, apesar de estar bem curto. Mas o calor de Beja em Agosto, também não ajudava a usar cabeleira.

Não havia Radioterapia em Beja, não havia em Évora (como há agora) e ainda não havia em Faro, o destino foi Carnaxide. Fui com a minha mae, vinha a Beja nas folgas da radioterapia, mas por coincidência, o meu pai, teve um acidente no meu carro um dia antes de ir para a radio e tive ir de táxi e posteriormente lavei o carro da minha cunhada, meu quase que ia para a sucata. O meu pai ficou ileso. E assim com carro, conseguia vir 4 dias a casa. O que era ótimo ainda ia ao trabalho a uma formação importante que estava a decorrer, dava para namorar e rever os amigos e familiares. A radioterapia não custou, usei bastantes cremes hidratantes e tive a sorte de não chegar a fazer ferida.

O tempo que passei em Carnaxide com a minha mae, foi muito proveitoso, pois aproveitamos bastante para passear, rever pessoas que não víamos há tempo que moram por Lisboa. Foi um mês bem passado.

Mas não me saía da cabeça, como sempre em todo o processo, que a minha tia tinha falecido de cancro, era difícil dividir a morte dela do meu cancro. Foi uma aprendizagem que fui fazendo.

A par disto criei um blog, www.isabelguerreiro.blogs.sapo.pt, onde ia relatando os meus sentimentos, as minhas dores, o desenrolar da minha doença.

Em Outubro terminei a radio, dia em que nasceu a Rita a minha sobrinha. O nascimento dela deu-me esperança. Achei sempre uma feliz coincidência, porque eu sentia-me a renascer.

Em Novembro, com o ano quase passado, tive consulta e o médico, disse-me que a partir dali iria ter consultas de rotina, para vigilância e para já estava tudo controlado, por acaso, não tenho em mente em que dia foi, mas foi um dia muito feliz. Era voltar à minha vidinha, ao meu dia-a-dia.

Fiquei a tomar o famoso Tamoxifeno, que levantava na farmácia do hospital, depois numa das consultas de rotina, que aconteceu em Março de 2007, o médico disse que ia deixar de tomar o Tamoxifeno e ia começar com outro tratamento, que chamou de Herceptin, coisa que eu ainda nunca tinha ouvido falar e não me explicou muito mais. Quando me apercebi que era na sala da quimioterapia, e se tomava da mesma forma, fez-me bastante confusão, só de pensar que ia passar por tudo, valeram-me as enfermeiras para me explicarem que não tinha efeitos e que era preventivo. Lá me sentei naqueles cadeirões mais 18 vezes, de 3 em 3 semanas durante 1 ano.

Encaminharam-me para a Cirurgia plástica no entretanto, coisa que perguntava sempre ao médico, quando é que podia fazer a reconstrução, tive sempre em mente que não queria ficar em desiquilibrio com o meu corpo, não queria levar os dias a tirar e a por prótese.

Passados quase 2 anos (Julho 2008) da mastectomia e já com o Herceptin terminado, fui chamada para fazer a reconstrução mamária, até aqui também me calhou a parte mais complicada, teve que ser com retalho da barriga, ou seja, tecido abdominal, músculo e uma veia puxada para irrigar a minha nova mama ou seja a minha barriga deslocada. Posteriormente e por causa da assimetria fiz redução da outra mama (Abril 2009).

Mas em mente continuava um sonho na minha cabeça e na cabeça do meu marido, marido porque depois de ter ficado bem, voltei a morar sozinha na minha casa e o Jorge foi lá ficando, até que se mudou para lá e casámos em Outubro de 2008, como dizia, o sonho era já comum, e queríamos ser pais, procurei uma medica ginecologista para saber se continuava apesar dos tratamentos, uma mulher fértil, ao que ela me disse que sim.

Combinamos com a médica de cirurgia plástica, parar as reconstruções para eu poder engravidar, o que aconteceu de imediato, ficamos tão contentes, a alegria era tão grande que não cabíamos em nós de felicidade. Só que a gravidez foi interrompida, numa consulta em que fui sozinha à obstetra, tive a noticia que o coração do bebe tinha parado. Tive que ser internada para fazer um aborto, que foi horrível.

Já tinha passado por tanto, que pensei em não entrar em tristezas e não me entregar ao desgosto de perder aquele filho. Mas é muito triste.

Passados uns meses estava grávida novamente. Grávida e felizes, tinha superado o cancro, com a ajuda de muito amor em meu redor, a reconstrução ia a mais que meio e agora íamos receber um filho. Achei sempre que a gravidez desta vez, ia chegar ao fim e assim foi, apesar dos meus 40 anos, tive uma gravidez tranquila e a 30 Novembro de 2010, nasceu o nosso filhote, Miguel…lindo…lindo…como qualquer mãe sonha. Tem agora 2 anos. E foi a melhor coisa que nos aconteceu. A razão, que nada acontece por acaso. A razão que hoje podemos estar menos bem, mas amanhã poderá ser melhor. A esperança tem que nos acompanhar, a força não nos pode faltar, porque garanto que tinha forças que nem sabia que existiam.

Costumam-me dizer que tive força neste processo todo, mas não há outra maneira de superar um cancro e eu costumo dizer que também é preciso ter sorte. Porque há quem tenha força e a sorte não aparece.

O que aprendi com isto tudo:

A viver um dia de cada vez…a pensar mais no hoje e que nada mesmo nada é eterno. Quanto mais aproveitarmos o agora, melhor…

E que apesar do processo da nos pormos bem, podemos ser felizes, a doença não é só infelicidade, fiz muita coisa no ano de 2006 que me fez ser feliz.

A partilha de experiencias é essencial, falar com pessoas que já passaram pelo mesmo é diferente do que desabafar com alguém que não sabe e não sentiu o que estamos a passar, partilhei muito a partir do momento em que criei o blog uma luz na escuridão (2007), criámos um grupo amigas do peito e coração, uma amizade forte que continua nos dias de hoje, mesmo com algumas perdas dolorosas, tão dolorosas que é como sentir que há um pouco de nós que parte com essa pessoa. Posteriormente com o acesso ao Facebook, pertenço também a vários grupos de partilha do cancro da mama, onde também criei novas amizades.

Hoje a minha vida é o mais normal possível, com algumas mazelas que ficaram, como dores nas costas, cansaço…cicatrizes…muita experiencia, muitas idas ao médico, rotinas de exames, sustos…e vivendo a aprender a saber lidar com a perda da mama.

Termino, dizendo que adoro viver…e quero ver o meu filho crescer com saúde e a saber que tudo o que passei não foi em vão, foi para o ter comigo….

 

Isabel Guerreiro

Beja

42 anos

 

Postado por Isa às 09:00
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Quinta-feira, 18 de Fevereiro de 2010

A vitória da vida

 

 

(O texto é longo, mas vale a pena ler)

Fonte: Familia Sapo 

 

 

Cada linha deste artigo reflecte uma história de vida que não deve perder.

Pela coragem. Pela determinação. Pela família que ficou com os dias virados do avesso. Pela Sandra, pelo marido que tem estado sempre do seu lado e pelas filhas.

É impossível ficar indiferente à história de Sandra Rodrigues. Com 28 anos e a viver a sua segunda gravidez, recebeu a notícia que jamais queria ouvir: tem cancro de mama. Com uma bebé na barriga e sem tempo para desfrutar da gravidez, Sandra foi obrigada a enfrentar um tumor que foi crescendo sem pedir autorização. Sempre com um sorriso, contou-nos toda esta experiência.

Texto e foto: Cláudia Pinto
 

Ainda faltam dois anos para a Sandra completar o 30º aniversário. Morena, simpática, mãe de duas filhas e lutadora. Características que marcam a forte personalidade da protagonista de uma situação pouco vulgar nos dias que correm.

A filha mais velha de Sandra nasceu no ano de viragem do século, com 3800 gr. Foi uma gravidez perfeitamente normal. Entretanto, Sandra e Lourenço – o marido – começaram a equacionar a hipótese de dar um(a) mano(a) à Sofia. Como a vida nunca parece estar preparada para receber um segundo filho nos dias que correm, Sandra foi adiando tal decisão. Corria o ano de 2007 quando começou a pensar que a diferença de idades de Sofia e uma bebé já seria notória. “Comecei a fazer exames para preparar a gravidez, inclusive ecografia da mama. Tinha sempre de os realizar por precaução porque tenho história de cancro da mama na família da parte do meu pai. Disseram-me que estava tudo bem e que poderíamos avançar. Foi o que nós fizemos!”, conta-nos Sandra.

A nossa entrevistada ia regularmente às consultas de planeamento familiar e preparou rigorosamente a decisão de ter mais um filho. Engravidou em Fevereiro de 2008 e tudo corria bem até que, dois meses depois, começou a sentir um caroço na mama esquerda. “Fui deixando passar porque pensava que estaria associado ao leite. Mais tarde, o caroço começou a doer-me e a fazer comichão. Ainda assim, optei por não falar logo com a médica. Ia apenas às consultas normais de gravidez. Queria viver a gestação tranquilamente e nunca comentei com a especialista. Apenas contei à minha família mas a primeira reacção de todos foi pensar que seria normal e que o caroço estaria relacionado com a gravidez”, explica Sandra.
 

Peito inflamado, dores e incómodo


A certa altura, Sandra já não aguentava muito as dores, custava-lhe a deitar-se em certas posições e o caroço ia aumentando de tamanho. Foi então que decidiu falar com a sua médica que, infelizmente, estava de férias. “A 18 de Agosto, tive de ir levar uma injecção por causa do meu tipo de sangue e pedi à enfermeira para me ver o caroço que me causava mesmo dor. Parecia que latejava! Ela apalpou e teve a infeliz ideia de comentar que me estava a nascer uma terceira mama… Não deve ter feito por mal e até acho que foi essa frase que me fez reagir”. Foi então que Sandra começou a pensar que algo de errado se estava a passar com ela. Nesse mesmo dia, deslocou-se à urgência do Hospital da Estefânia. Estava nas 27 semanas de gravidez. “A médica foi muito simpática, apalpou o peito mas não detectou nada de grave e mandou-me voltar no dia seguinte para tentar ser vista na consulta de Senologia. Foi o que fiz, fui atendida pela Dr.ª Ondina Henriques que já se reformou e que foi muito acessível. Ela apalpou e achou que, como estava grávida, não se podia facilitar e seria preferível fazer todos os exames necessários. Prescreveu-me uma mamografia, uma ecografia e uma biópsia de agulha fina”, acrescenta.

Sandra ainda decidiu ir de férias para o Alentejo – onde vivem os pais – e depois do regresso, dirigiu-se ao Hospital de São José para realizar os exames solicitados que tinham já ficado marcados. Nessa altura, ainda não sabia se a biopsia seria mesmo necessária. No entanto, como a médica não gostou do que viu nos outros exames, optou por realizá-la. “Os exames são um pouco mais dolorosos estando grávida, fui obrigada a usar uma protecção específica para proteger a bebé das radiações da mamografia. Na biopsia, levei menos anestesia do que deveria por estar grávida. Acabou por não ser com agulha fina mas com uma espécie de cânula para retirarem mais tecido. O exame foi muito doloroso. Disseram-me que o resultado estaria pronto de oito a dez dias. Saí de lá de rastos!”

No fim-de-semana seguinte, foi a uma festa no Alentejo mas sentia-se muito cansada. Voltou na 2ª Feira e teve de ir ao Hospital da Estefânia pois tinham agendado uma consulta de gravidez de alto risco. Nessa altura o processo tinha passado para outras duas médicas, Dr.ª Fazila Mahomed, senologista e cirurgiã e Dr.ª Raquel, obstetra.
 

Uma agitação fora do normal


“Comecei a reparar numa agitação um pouco invulgar. A minha prima Lara trabalha no Hospital da Estefânia e andava comigo de braço dado para todo o lado porque ela já sabia o que se passava. Parecia a minha sombra por mais que lhe dissesse para ir trabalhar e para me deixar à espera de ser chamada. Entrei para a consulta da obstetra que decorreu de forma normal. Entretanto, comecei a ver uns papelinhos amarelos em cima da mesa com pedidos de novos exames. Comecei a ler “ecografia abdominal, ecografia ao fígado, ecografia à tiróide... Percebi logo que algo se passava porque numa gravidez normal não há necessidade de realizar estes exames. Perguntei à médica obstetra para que é que seria aquilo mas ela não foi capaz de me dizer nada… A outra médica que me estava a acompanhar pediu à minha prima – que acompanhou a consulta - para ir marcar aqueles exames dos tais papelinhos amarelos. A médica, entretanto, já tinha o resultado dos exames que supostamente iriam demorar oito a 10 dias a estar prontos. Ela disse-me: a Sandra vai ficar internada hoje e vai ter de fazer uma mastectomia radical. O meu cérebro começou a ficar agitado e a pensar como é que poderia realizar uma mastectomia estando grávida”. A prima de Sandra já sabia do que se passava desde 6ª Feira, altura em que todos os especialistas de Senologia e de Obstetrícia planearam minuciosamente a visita de Sandra ao Hospital para realizarem a cirurgia. Depois da consulta, Sandra deu a notícia ao marido que ficou também sem reacção. “A médica mandou-me ir fazer o electrocardiograma, os exames necessários e ir à consulta de anestesia para saberem se podiam avançar com a mastectomia no dia seguinte. Disse-me ainda que iria ser depois levada para o 5º piso para ser internada. Eu tinha acabado de chegar do Alentejo, não tinha preparado nada e não nem sequer me deram oportunidade de ir a casa. Não tinha roupa nem objectos pessoais. Fiz todos os exames muito nervosa e as pessoas que se cruzavam comigo no hospital ficavam com as lágrimas nos olhos porque este quadro clínico habitualmente já é mau mas numa pessoa grávida, ainda é pior”, confessa.
 

 

Postado por Isa às 12:16
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Sexta-feira, 9 de Outubro de 2009

A minha história no cancro da mama

 

 

 

Para quem tem chegado ao meu blog recentemente, e não conhece a minha história pelo cancro da mama, aqui fica o meu relato.

 

Tenham um bom fim-de-semana.

 

Estávamos em Novembro de 2005, quando me deram uma cotovelada na mama esquerda, doeu-me logo e ficou a incomodar-me, começou a fazer um empastamento que não gostei nada. Fui ao centro de saúde, mandaram-me fazer uma eco... ( para mandarem fazer mamografia, é preciso sei lá o quê) conclusão, não detectaram nada nessa eco, tomei antibiótico e não melhorou. Previa um cenário não muito bonito, voltei ao centro, disseram-me para fazer nova eco mas que pedisse para fazer com outra radiologista (o primeiro que me fez era novo na especialidade, azar o meu) com isto, já estávamos em Janeiro de 2006. Fui fazer a eco, e a Dr.ª disse que tinha que fazer mamografia, e combinamos ir dai a 8 dias ter com ela ao hospital. Estas esperas são sempre longas e ficamos muito ansiosas. Dia 5 de Janeiro fiz eco, mamo e disse que tinha que fazer biopsia, se queria fazer já ou daí a 8 dias, disse-lhe que queria já. Estava sozinha. Comecei logo a chorar. A tia que acompanhou o meu crescimento mais de perto, tinha falecido havia 6 anos, de cancro da mama, e estar a passar por isto, estava a fazer lembrar-me o sofrimento dela, e o facto de ela n ter conseguido vencer.
E para ajudar a este turbilhão de emoções,  uma das minhas melhores amigas, da minha idade, andava a fazer exames desde Agosto de 2005, desconfiada que tinha cancro da mama, e já tinha feito a biopsia, estava a espera do resultado.
A médica passou-me logo uma carta para o oncologista, pois viu logo o que aquilo ia dar, mas eu não quis ver, acho. Só dois dias antes da consulta é que vi que se chamava consulta de decisão. E ai vi que só podia ter cancro, porque se não, porque haviam de ir decidir alguma coisa...mas não contei a ninguém.
Dia 19 de Janeiro fui à consulta, muitas horas de espera, mas já não fui sozinha, levei a minha irmã mais velha.
Entrámos e o medico disse isto tão claro como a agua, a Isabel sabe porque esta aqui, a Isabel tem cancro da mama.

É esta a frase que tenho usado sempre...o mundo caiu-me em cima...

A minha irmã, que estava mesmo a pensar que aquilo tinha sido da cotovelada acho que ainda reagiu pior do que eu. Eu gritava que queria ter um filho e não um cancro, uma médica chorou...de emocionada que ficou, senti-me abandonada por quem eu achava que me protegia lá do alto (minha tia e minha avó falecidas em 1999 e 2003, hoje sei que nunca me faltaram).
Depois de chorar disse á equipa - quando falava socialmente se algum dia uma coisa destas me acontecesse dizia que não queria ser tratada e que durasse ate durar, hoje perante a doença e caindo na realidade não vejo as coisas assim, e claro que quero que me tratem o que há a fazer, vai-me cair o cabelo???? Vou ficar sem mama??? Foram as minhas preocupações.
E eles lá me disseram que sim,  que iria fazer 8 sessões de quimio depois operação e mais tarde rádio.
E para me dirigir ao laboratório para fazer analises que amanha dia 20 de Janeiro de 2006, iria começar a quimio.
Foi tudo muito rápido, de um momento para o outro passei de saudável, de uma pessoa cheia de vida, cheia de trabalho, a doente, doente oncológica.  Assusta...
Fui eu que contei aos meus amigos, familiares e nesse dia depois de chorar levantei a cabeça e disse para mim, vou conseguir, vou-me salvar deste maldito cancro, este não é o meu ponto final, é uma virgula, a vida continua.
Pensei em deixar o meu namorado, não queria que ele sofresse comigo, queria que ele continuasse com a vida dele, sem ter que assistir a isto tudo, mas quando lhe fui contar, as palavras dele as emoções e as atitudes fizeram-me mudar imediatamente de pensamento, ele seria a minha força, a minha garra à vida, prometi a mim mesma que teria que viver para o fazer muito feliz depois de me tratar.

Nesse mesmo dia 20 de Janeiro a minha amiga soube o resultado da biopsia, também ela tinha cancro da mama.

Fui a Fátima, rezei, coisa que antes de saber se tinha cancro da mama, ou não, não consegui fazer, foi estranho, mas nem no terço conseguia agarrar.

E como se espera nos tratamentos, fiquei sem cabelo, engordei, fiquei pálida, sem pelos, tive enjoos, má disposições, dores nas costas, dores nas pernas, febres, aftas, as unhas escuras, a pele seca, irritabilidade, não tinha paciência, muito sensível.

Mas Graças a Deus, correu sempre tudo nos tempos, nunca falhei um tratamento, alimentava-me bem, só não tinha apetite nos dias dos tratamentos.
Fiquei de baixa, mas depois achei que em casa, estava pior, tinha tempo para pensar, e tinha era que estar ocupada, perdi o sono, comecei a ficar dependente de comprimidos para dormir, isto depois de tentar descobrir qual o comprimido que fazia efeito, comecei a trabalhar e só faltava algum dia ou outro que não tivesse bem, o tratamento era a sexta, para ter o fim de semana para recuperar, mas as vezes os sintomas só apareciam lá para terça ou quarta, era ai que faltava, tinha que ser.

Custei a separar o cancro da morte, só me vinha a ideia que a minha querida tia, que eu tanto acompanhei tinha falecido de cancro, com o tempo fui conseguindo, fui conhecendo histórias de sucesso e isso deu-me muito alento.
A queda do cabelo custa, mas se pensarmos que são
4 a 6 meses da nossa vida...a coisa vai-se levando...
Coloquei logo a peruca, ficava bem diferente, mas não havia alternativa, nunca gostei de me ver com os lenços.
Tenho que confessar, que nem tudo foi mau, estava doente, mas tentei fazer a minha vida normal, não saia tanto, mas não me fechei em casa. Também fui feliz nesse tempo, não o posso negar.
Terminei a quimio em Junho, um dia depois de fazer 36 anos, agora era aguardar que me chamassem para a cirurgia.
Ainda tive uma consulta, e o medico perguntou-me se eu queria fazer mastectomia ou se preferia tirar só o nódulo que até tinha diminuído, correndo as consequências dos riscos que poderiam vir dessa decisão. E eu disse que havia 6 meses que me andava a preparar para a mastectomia e que queria fazer.
Fui de férias para
o Algarve, umas férias mais calmas que o costume, praia, só de longe, sem apanhar sol, um Agosto bem diferente dos outros todos.
Dia 6 chamaram-me para ser internada dia 9 e operada dia 10, e assim foi. 
Éramos
3 a ser operadas nesse dia, fui a última, a espera foi longa.
No dia a seguir o penso descolou e eu vi logo a minha cicatriz, não me fez tanta impressão, como pensava. Mas eu estava mutilada, estava diferente, era uma nova Isabel, era a Isabel que o cancro da mama tinha deixado e tinha que aprender a viver assim.
Não hesitei em mostrar ao Jorge, foi com a maior das naturalidades. Era eu na mesma, e foi isso que ele me disse.

Quando entrei para o hospital, o cabelo estava a começar a crescer, só lá estive 5 dias, mas o suficiente para já não usar a peruca, pois enquanto lá estive não a usei e depois até parecia que aquilo não tinha sido o meu cabelo nos últimos seis meses.

O cabelo estava mesmo muito curto, mas já não voltei a usar a prótese capilar, já que agora a prótese a usar tinha que teria que ser a da mama.
Dai a um mes mais ou menos fui chamada para a Rádio, ainda fiz fisioterapia, pois o braço estava muito preso.
Tive um mes e pouco em Carnaxide para fazer os 25 tratamentos de Radioterapia, tinha tratamento ao sábado e ao Domingo,  vinha a Beja à quarta e quinta, ou seja esses eram os meus dias livres, mas eu vinha logo a terça e ia para cima à sexta.
Terminei no dia que nasceu a minha sobrinha Rita, foi um prenúncio que estava livre, que tudo tinha acabado bem. Foi vida nova, isto em Outubro de 2006.

A minha amiga nesta altura também já estava safa do cancro da mama.
A partir dai, comecei com rotinas de 3 meses, uma das quais (Abril de 2007) me foi dito que iria começar a fazer um tratamento que seria bom para mim, não percebi muito bem, mas no dia D, lá fui ao hospital, fazia-se na sala de quimio, o que foi um pouco doloroso, parecia que estava a reviver tudo, mas depois as enfermeiras explicaram-me que o tratamento era de prevenção e que não iria ter os mesmos sintomas, embora tudo o resto fosse igual, 2 horas sentada nos cadeirões, mas só me provocava sono e fome. Por isso adquiri mais peso.

 

A par disto tive consultas de cirurgia de reconstrução, mas só poderia começar quando o tratamento acabasse, e tive muita sorte com as datas, porque assim que terminou os 18 tratamentos de herceptin que durou um ano, terminando em Abril de 2008, chamaram-me para fazer a primeira operação de reconstrução que acabou por acontecer em Julho de 2008.

No dia anterior tirei uma foto, para ficar de recordação, e foi nesse dia que tive consciência de como estava, nunca me senti diminuída como mulher por não ter uma mama, claro que as vezes ficava triste porque não podia vestir certas roupas, mas ao ver a foto no ecrã do Pc, parecia que não me estava a ver a mim, não me reconhecia, mas como já ia fazer a cirurgia no dia seguinte, não me afectou.

A operação de 7 horas, chamada de TRAM, correu bem, tive algumas dores ao acordar, mas que foram passando, tive internada 6 dias, estava desejosa de vir para casa, esta operação foi em Évora porque Beja não tem este serviço e sentia-me longe de casa.

Não dou de conselho às mulheres a fazerem a reconstrução, umas dizem que não querem sofrer mais, eu respeito, o que digo é que me sinto melhor assim, que valeu a pena a operação.

Casei ainda nesse ano em Outubro, não tinha o sonho de casar, mas depois de muito conversarmos achamos que tínhamos que ter uma data para festejar, para lembrar, para juntar a família e amigos, ter o nosso dia.

Fiz mais uma reconstrução em Abril de 2009, é o mal destas reconstruções, não é uma e já esta, são várias.

Esta é a minha história no cancro da mama, muito havia ainda para dizer, mas o que tento dizer e transmitir sempre, é que não podemos baixar os braços, o cancro também morre e que no processo e no caminho da nossa “cura”, podemos ser também felizes e proporcionar a nós mesmos momentos bons na nossa vida.

Um dia de tristeza é um dia que estamos a desperdiçar, e queremos tanto aumentar dias felizes à nossa vida.

Tenho conhecido gente fantástica, decepcionei-me com algumas pessoas, mas ganhei a amizade de outras, nem sempre as pessoas que achamos que podem ficar a nosso lado, ficam. Mas umas compensam as outras.

No decorrer deste tempo, perdi amigas, amigas e "colegas", é um sentimento de perda muito forte, que infelizmente temos que passar. Amigas que me ensinaram muito e me deram a conhecer tanta gente boa, às amigas do peito e Coração, o meu obrigada, tudo foi mais fácil e claro a partir do momento em que as conheci e começaram a fazer parte da minha vida.

O meu amor, os meus pais, irmãs, cunhados, sogros, sobrinhas, restante família e alguns bons amigos, foram e são muito importantes na minha vida e sei que posso sempre contar com eles.

E como sempre digo, nunca vou conseguir agradecer o que fizeram por mim. Obrigada mais uma vez.

Hoje sinto-me bem, e o que conta é o dia de hoje, sem pressa do amanhã. Continuo e continuarei com as rotinas dos exames das consultas e só peço a Deus que me ajude e que vá sempre tudo estando bem.

Agora, é viver a vida na plenitude, pensar mais no hoje, não adiar projectos, não me chatear com futilidades, dar importância ao que realmente é importante.

 

Porque, como se diz em Rosa Esperança, o melhor, o melhor ainda está para vir...

Postado por Isa às 15:59
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Segunda-feira, 13 de Julho de 2009

Arrepiante, mas Feliz, esta história de Vida

  • Olá a todos! Eu chamo-me Vânia e há 5 anos atrás foi-me diagnosticado um tumor do ovário direito.Com 23 anos eu fazia habitualmente consultas de rotina no ginecologista e de um momento para o outro foi-me diagnosticado um tumor maligno no ovário, fui logo operada e foi-me retirado o tumor e o ovário. Um mês depois começo a desmaiar e os médicos diziam ser normal, eu não me acomodei e continuei a procurar ajuda em todo o tipo de especialidades e todos diziam ser normal, até ao dia em que encontrei o meu ANJO DA GUARDA na urgência do hospital e viu k algo estava mal. Comecei a fazer exames e é-me detectado uma metástase do ovário no pulmão esq. com mais de 13cm e outra no pulmão direito com 3cm, o médico quando me informou apenas faltou dizer que eu ia morrer, não o disse mas pensou-o! Comecei logo a fazer tratamentos no HUC, fiz muitos tratamentos que eram muito rígidos e dolorosos, eu sempre me mantive firme e nunca me resignei á doença (embora o desespero por vezes se apoderasse de mim). Tive muita FÉ, tive muitos amigos e família que foram incríveis ao meu lado e principalmente, tive os melhores profissionais do mundo a tratar de mim. Lutei, desesperei, chorei e venci (por enquanto)!!! Por ter tido mais cinco anos de vida tudo valeu a pena! Mas a vida sorriu-me depois de todo o sofrimento, quando já me considerava a mulher mais sortuda do mundo por estar viva e a recuperar a minha vida eis que contrariando novamente a medicina fiquei grávida! Fiz dezenas de tratamentos, fiz menopausa e apenas com um ovário fiquei grávida á primeira tentativa. Hoje tenho um filho lindo de 3 anos, que é a minha vida, o meu milagre a minha paixão. Aprendi que na vida todos temos uma linha traçada e temos obstáculos que temos de ultrapassar. Sempre pensei que o que tivesse de ser na vida seria mas eu não me iria dar por vencida. Doeu muito, ainda hoje dói, esta doença muda tudo na nossa vida, hoje penso em ser feliz e viver um dia de cada vez. O que tiver de ser será! Maldita doença que tanta dor causas! Força a todos e muita FÉ, porque ela move montanhas e faz milagres.
    vania04/Apr/2009
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    Postado por Isa às 17:18
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    Quarta-feira, 4 de Fevereiro de 2009

    Mais um testemunho no dia mundial contra o cancro

    Raquel Carvalho,  20 anos

     

    "Como me consegui curar de um linfoma

    O emocionante relato de uma mulher que descobriu que tinha a doença aos 20 anos

    Aos 20 anos, foi-lhe diagnosticado um linfoma não-Hodgkin, não operável. Ultrapassou vários meses de quimioterapia, um transplante de medula e até um coma induzido.

    Hoje, passados nove anos sobre o dia C (de cura), recorda um dos seus trunfos para sobreviver:

    «Não podemos aceitar, nem imaginar a morte. Temos de nos imaginar vivos e agarrarmo-nos a essa ideia», desabafa.

    Aos 20 anos Raquel Carvalho vivia em Alter do Chão rodeada da família e dos amigos de sempre, no descuido feliz e privilegiado tão próprio da juventude. Nesse tempo, «tudo era fantástico». Fazia muito desporto e, no seu calendário, as festas estavam em lugar de destaque», revela.

    «Muito confiante, era (e é) uma força da natureza, para quem acordar já é uma celebração e dormir uma perda de tempo. Subitamente, manifestam-se pequenos sintomas invulgares. Começa a sentir-se excessivamente cansada e sem forças para acompanhar os amigos.

    Dorme muito. Para alguém com tanta energia tudo isto era preocupante, mas nem lhe passava pela cabeça que poderia ser alguma coisa grave, até ao momento em que mesmo as tarefas mais simples, como conduzir, se lhe tornaram insuportáveis: «sentia uma dor no peito tão forte que conduzia encolhida. Além disso, doía-me o coração e estava sempre a dormir», revela.

    Como nunca se queixara de dores, nem nos desportos exigentes que praticava (pegava touros, andava de mota, fazia ski e caçava), os pais levaram estes sintomas muito a sério. Após uma consulta ao médico de família, que percebe imediatamente do que se trata, Raquel é enviada de urgência para Lisboa onde se submete a uma série de exames exaustivos.

    E ali, com muitos médicos à sua volta é-lhe revelada a terrível notícia. Mas é também ali que surge uma nova Raquel com uma força, uma coragem e uma maturidade que até ela própria desconhecia possuir.

    «Só me apercebi de que se tratava de alguma coisa muito grave quando entrei numa sala e vi toda a família reunida. Estavam lá todos, mesmo aqueles que só vejo nas festas e no Natal», conta Raquel, que ainda guarda lembranças muito nítidas desses momentos:

    Perante as lágrimas e a tristeza de todos, foi ela que ainda se sentiu obrigada a reconfortá-los com a sua alegria e boa disposição de sempre. «O médico foi muito directo e disse-me: Raquel tens um cancro.

    A seguir explicou-me detalhadamente os tratamentos, falou na queda de cabelo e avisou-me que eu poderia ficar muito magrinha ou muito gorda».

    Respondeu: «Espero ficar gorda para aguentar os tratamentos.» Por isso, ao longo de todo o processo, fez sempre um esforço enorme para não vomitar, pois tinha muito medo de perder peso.

    Desta maneira engordou oito quilos, o que para uma jovem vaidosa equivale a ficar uma bola, recordando ainda que foi ela, «com uma força vinda não sei de onde» a perguntar ao médico se podia começar os tratamentos logo nesse mesmo dia.

    De resto, e perante a reacção apavorada dos pais, Raquel não deitou uma lágrima e nunca admitiu sequer duvidar de que iria conseguir ultrapassar este obstáculo. O diagnóstico revelara um linfoma não-Hodgkin, não operável.

     

    A quimioterapia começou imediatamente: quatro meses de tratamentos em que «a ressaca da quimio fazia-a em casa», recorda. Raquel cumpre as dolorosas etapas do tratamento com a tenacidade de um atleta.

    No primeiro tratamento continua a viver no Alentejo e só permanece em Lisboa quando o médico a quer vigiada. Como menina do campo que era, detestava a cidade e, assim, para se distrair entre idas e vindas do hospital passou a ir para Monsanto praticar tiro aos pratos.

    Como caçava desde pequena, tinha óptimas prestações, de tal modo que acabou por entrar em competição tornando-se campeã Nacional, «mas como só estava ali para me divertir, quando o assunto se tornou demasiado sério abandonei a modalidade».

    Foi outra das suas pequenas distracções que a conduziu à sua actividade actual, o restauro, que começou a desenvolver através de pequenos cursos livres de pintura decorativa. Tirava tanto prazer disso que depressa percebeu que seria esse o seu caminho profissional, lembrando-se que essa paixão já vinha da infância, quando passava horas a fio a observar os tectos trabalhados e os objectos antigos com uma atenção invulgar.

    A primeira boa notícia e a recaída

    Finalmente, no dia 23 de Dezembro 1998, o médico deu-lhe os parabéns. «Estava limpinha», relembra. A bolsa alojada entre o coração e os pulmões havia desaparecido.

    «Foi o melhor presente de Natal!», recorda. Sem esperar mais, Raquel voltou a correr para Alter do Chão, extasiada por poder recuperar a sua vida. «Então fiz tudo! Queria voltar a sentir a adrenalina, festejei, saí muito, voltei ao desporto».

    Em Março, foi para a neve esquiar mas, antes da viagem, foi a uma consulta de rotina. Continuava tudo bem. Na neve partiu um dedo, mas divertiu-se muito, «foi uma semana óptima». Quando voltou, voltaram também os sintomas: sono e muitas dores.

    Mais uma vez, os pais levaram-na de imediato ao médico e a noticia era terrível. Numa semana, o linfoma não só tinha voltado com estava maior ainda. «Era agora uma bolsa com um palmo de comprimento. Não percebo muito dos detalhes, porque tinha 20 anos e foi a explicação que me deram.

    Tanto quanto me parece, a célula mãe não tinha morrido, a actividade excessiva do coração activou-a e o linfoma cresceu desmesuradamente». A situação era gravíssima.

    Desta vez, Raquel ficou internada no IPO durante todo o tratamento, chegando mesmo a ficar isolada no Aquário durante alguns meses. «No Aquário só se entra esterilizado e totalmente equipado com batas, sapatos e luvas verdes. É surreal, um cenário de ficção científica, onde eu só via os olhos das pessoas», refere.

    O tratamento implicou quimioterapia e um transplante de medula óssea. «Como não era compatível com ninguém fiz um transplante da minha própria medula.». Para isso, teve de passar por um coma induzido.

    Essa foi talvez a parte mais dolorosa de todo o processo, porque podia não voltar. «Essa foi uma das raras vezes em que tive um ataque de choro mas nunca me visualizei a morrer», relembra, reforçando «não podemos aceitar, nem imaginar a morte. Temos de nos imaginar vivos e agarrarmo-nos a essa ideia.»

    Agarrada à vida como sempre esteve, Raquel fez amigos na enfermaria que se mantiveram junto dela depois de entrar para o Aquário. Ali, num profundo isolamento, contou sempre com o conforto da presença desses companheiros de dor e alegrias, com quem comunicava por carta.

    Escreviam-se todos muito e para os tranquilizar, quando se aproximou o momento do coma induzido, avisou-os de que durante uns dias iria estar ausente, adormecida, mas que não se preocupassem pois voltaria.

    Ainda hoje e para sempre Raquel se refere a esses amigos como os seus «anjinhos da guarda».

    Finalmente, e quando o linfoma já estava reduzido ao mínimo graças aos tratamento de quimioterapia, estava na altura de fazer o transplante e de partir para a mais temível das etapas, o coma induzido. Dali, ou acordava e teria à sua espera a melhor de todas as notícias, ou não regressaria mais.

    Mas tal como era esperado, correu tudo muito bem e, ao acordar, Raquel não conseguiu conter uma explosão de alegria. Sem pensar, levantou-se da cama a gritar e a dançar «estou viva, estou viva e um e dois e um e dois», simulando uns passos de aeróbica.

    Esta brincadeira durou três ou quatro minutos, até um médico a obrigar a deitar-se de novo. A breve manifestação de entusiasmo valeu-lhe três dias sem se conseguir mexer.

    Seguiram-se dois meses de tratamentos diários com radioterapia «muito cansativos», ao longo dos quais fez novos amigos, nunca deixando, sempre que podia, de ir visitar os seus «anjinhos», na enfermaria do IPO.

    «No dia 27 de Julho 1999, o médico disse-me finalmente que estava tratada. Essa data passou a ser mais importante que o meu próprio aniversário, que é três dias antes.» De tal forma que, actualmente Raquel festeja com a família e os amigos o dia dos seus anos e o dia da confirmação da sua cura, que inclui missa.

    «Agradeço a Deus todos os dias, por estar viva, por mais um dia, mais uma lágrima, mais um amigo.» Sempre foi muito religiosa mas tudo por que passou reforçou a sua fé, tornando-a ainda mais crente.

    «Saber que tanta gente rezava por mim dava-me muito conforto e a partilha diminuía a minha dor», confessa. Para trás ficaram alguns amigos de infância e juventude.

    «Ninguém me abandonou, mas não souberam encarar. Não os culpo, tive de me afastar deles por uma questão de autodefesa», admite. Desde o início que Raquel encarou tudo de frente, não se escondeu e manteve a sua dignidade e vaidade.

    Cortou o seu próprio cabelo, combinou jantares para que os amigos a vissem, fotografou-se e filmou-se várias vezes durante o processo, para não esquecer e, simultaneamente, para se lembrar que continuava linda. «É tudo uma questão de mentalização», assegura.

    Tem fotografias suas de cabelo comprido, curto e rapado. Instantâneos onde enfrenta a câmara com alegria e coragem, magrinha e depois mais gordinha, mas sempre maravilhosa. Alguns amigos achavam que ela tinha de se esconder, ficar em casa.

    Esses tratavam-na com pena. Raquel reagiu. «Eu não era uma coitadinha! Tudo o que eu não queria era que me vissem assim. Se eu acreditasse que era uma coitadinha morria!»

    Mas outros, improváveis e que mal conhecia, revelaram-se pessoas extraordinárias, «tratavam-me como igual, como uma do grupo. Esses acompanharam-me e deram-me força, sem paternalismos.»

    Em 2008, fez 30 anos, mas mais importante ainda, cumpriu nove desde que está tratada e que nasceu uma nova pessoa. «Eu era muito dura e achava que chorar era uma vergonha, não gostava de demonstrar sentimentos.»           

    Desde então mudou muito: «Deixei de esconder sentimentos. E não perco tempo com pessoas com quem não me sinto bem». Descobriu também a força e a beleza de um abraço. Curiosamente agora também adora Lisboa, que é onde vive e onde fez, literalmente, o seu ateliê de restauro.

    «Acordo de manhã e sou feliz, sou sempre feliz, mesmo quando estou em baixo. Os depoimentos que tenho dado, têm-me feito confrontar outra vez com a doença e com as perdas e isso já me tem feito chorar», desabafa.

    «Mas e se a minha doença tivesse sido uma dádiva? Se não fosse esta lição, quem sabe se eu não eu iria desperdiçar a minha vida e não lhe dar o devido valor?», interroga."


     

    Os conselhos de Raquel Carvalho

    Esperança
    «Apesar de tudo e de todos os males, aceitem o que está a acontecer. Agarrem-se à ideia de que é passageiro.»

    Acreditar
    «Agarrem-se à vida com todas as forças, mesmo as que desconhecem. Visualizem que ainda têm muito para viver. Arranjem um motivo muito forte para suportar a doença, pode ser uma pessoa ou uma causa.»


    «O truque do anjinho – peçam muito ao vosso anjo, ou a algo em que acreditam, que vos ajude a suportar as dores; eu pedia ao meu anjinho para me tirar as dores e sofrer um bocadinho por mim. Esta mentalização ajudou-me muito.»

    Aos Amigos
    «Tratem as pessoas que estão doentes da mesma forma de sempre. Não os deixem desistir e transmitam força, não piedade!»


     

    Texto: Marta Gonzaga
     


     

     

    A responsabilidade editorial e científica desta informação é da revista

     
    in sapo saude

                                                                                      

     

     

     

    Postado por Isa às 21:27
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    Sexta-feira, 4 de Janeiro de 2008

    Testemunho

    Hoje voltei a enviar o meu testemunho para a o site Ame e Viva a Vida, já é a segunda vez, da outra não foi aprovado, pelo que fiquei a saber, não estava assinado.

    Agora foi conforme.

    "Já aprendi que a troca de experiências nesta doença (cancro da mama) é muito valiosa, o passa palavra de como em certas e determinadas situações devemos proceder, não só a nível da cura, mas também em termos legais, os nosso direitos.

    Neste momento estou a fazer um tratamento de prevenção, de 3 em 3 semanas durante um ano, termino em Março, foi-me diagnosticado cancro da mama em Janeiro de 2006 com 35 anos, claro que reagi como toda a gente nesta situação, achei que o mundo me tinha caído em cima, mas todos os dias são dias da nossa vida, e como tal, fui aprendendo a viver com o medo dos exames, da doença, da cura...passei por 8 tratamentos de quimioterapia, operação de mastectomia e 25 sessões de radioterapia...em Novembro de 2006 já falava da doença. como algo mau, mas do passado...tinha muita fé e esperança, que tenha sido só mesmo uma fase e que consiga retomar a minha vida onde ela tinha parado e ser muito feliz com os que me rodeiam.

    Sinto-me uma mulher feliz... e devo isso aos que amo e aos que me amam.

     

    Isabel Guerreiro"

    ****

    Foram estas as minhas palavras

    Postado por Isa às 11:10
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